
Pesquisa desenvolvida no âmbito da Pós UFG é capa de revista internacional com proposta inovadora no combate ao câncer
Nanopartículas biomiméticas permitem tratamento térmico mais preciso e promissor contra o câncer
A pesquisa desenvolvida na UFG tem ganhado repercussão internacional ao propor uma alternativa inovadora para o combate a tumores agressivos, como o glioblastoma. A partir do uso de nanopartículas magnéticas e biomiméticas, os pesquisadores desenvolveram um sistema capaz de localizar e tratar células tumorais com precisão, utilizando calor. O trabalho foi destaque na capa da prestigiada revista ACS Applied Materials & Interfaces, da American Chemical Society. Intitulado “Near Infrared Biomimetic Hybrid Magnetic Nanocarrier for MRI-Guided Thermal Therapy”, o artigo tem entre seus autores o doutorando do Programa de Pós-Graduação em Física (PPGF) João Vitor Ribeiro Rocha e seu orientador, o professor do PPGF e coordenador do Centro de Pesquisa Integrada em Nanomedicina (CNanoMed), Andris Bakuzis.
A base do estudo é o uso de nanopartículas de óxido de ferro, já aprovadas para uso clínico. As nanopartículas têm função terapêutica (via hipertermia) e função diagnóstica, atuando como agentes de contraste em exames de imagem por ressonância magnética, o que permite o monitoramento em tempo real da entrega terapêutica. Essas partículas são projetadas para aquecer ao serem expostas a laser ou a campos magnéticos alternados, gerando calor diretamente nas regiões tumorais. O processo, chamado de hipertermia, eleva a temperatura do tecido canceroso até cerca de 43°C, comprometendo a sobrevivência das células tumorais e estimulando respostas do sistema imunológico.
“A terapia térmica em si, pode ser invasiva também, mas nós não estamos fazendo de forma invasiva. Como utilizamos as nanopartículas e utilizamos o laser ou o campo magnético, a gente não tem essa invasividade porque ambos conseguem penetrar a pele e acertar as nanopartículas que estão lá dentro”, explica João Vitor.
O diferencial do estudo está na construção de nanopartículas biomiméticas, ou seja, que imitam a biologia das células cancerosas. Revestidas com fragmentos de membranas celulares de tumores reais, as partículas conseguem "enganar" o sistema imunológico e circular por mais tempo no organismo, até alcançar o tumor-alvo.
Segundo João Vitor, as nanopartículas desenvolvidas no estudo são recobertas com fragmentos da membrana de células tumorais, o que permite explorar interações homotípicas — um tipo de afinidade biológica em que proteínas semelhantes presentes nas membranas facilitam o reconhecimento entre células do mesmo tipo. Esse mecanismo aumenta a probabilidade de as nanopartículas se ligarem diretamente às células do tumor, aprimorando a eficiência do direcionamento terapêutico.
Terapia térmica guiada por imagem
O projeto é fruto de anos de pesquisa e infraestrutura sofisticada, viabilizados por investimentos no Centro de Pesquisa Integrada em Nanomedicina (CNanoMed), coordenado por Bakuzis. O grupo utiliza equipamentos de imagem por ressonância magnética pré-clínica para acompanhar a trajetória das partículas em tempo real. “Nós temos um laboratório extremamente sofisticado hoje, fruto de vários financiamentos que conquistamos com muita raça. A partir de agora com a chegada do equipamento de MRI estamos conseguindo fazer imagens que não conseguíamos antes. Isso nos dá um nível de competitividade internacional de destaque”, afirma o professor.
Segundo o professor Andris Bakuzis, o uso da ressonância magnética pré-clínica permite monitorar a chegada das nanopartículas ao tumor em tempo real, desde que elas funcionem como agentes de contraste — como é o caso do material desenvolvido no estudo. Isso permite que os pesquisadores ou clínicos saibam exatamente quando a partícula terapêutica atinge a região-alvo, possibilitando a aplicação do tratamento térmico de forma não invasiva e no momento mais adequado.
Mais do que uma inovação em nanotecnologia, o estudo dialoga com princípios fundamentais da física médica. A terapia térmica pode ser usada isoladamente ou em combinação com tratamentos tradicionais como radioterapia e quimioterapia, potencializando seus efeitos e reduzindo os danos colaterais. De acordo com o professor Andris, o aumento de temperatura proporcionado pela hipertermia tem efeitos benéficos quando combinado a terapias tradicionais. No caso da radioterapia, o calor eleva o fluxo sanguíneo e, consequentemente, a oxigenação da região tumoral — fator essencial para a formação de radicais livres que promovem a morte celular. Já na quimioterapia, o aumento térmico eleva a permeabilidade da membrana celular, facilitando a entrada dos fármacos e tornando o tratamento mais eficaz.
Perspectivas para o futuro
Embora a terapia térmica com nanopartículas magnéticas já tenha sido aprovada na Europa para certos tipos de câncer, o professor Andris Bakuzis avalia que sua adoção ainda é limitada por questões relacionadas ao monitoramento térmico — em especial, pela ausência de técnicas eficazes de termometria capazes de garantir o controle da entrega de calor durante o tratamento. O grupo da UFG, no entanto, está desenvolvendo metodologias para sanar essa limitação. De acordo com o professor Andris Bakuzis, eles conseguiram realizar, em laboratório, o monitoramento térmico utilizando outros tipos de nanopartículas. Segundo ele, esse avanço é fundamental para garantir a segurança clínica das terapias, e os resultados obtidos estão atualmente sob avaliação em uma revista científica especializada.
A tecnologia desenvolvida pelo grupo se diferencia por combinar funcionalidades raras: direcionamento inteligente, geração de calor controlado e rastreamento por imagem. “São poucas equipes no mundo que conseguem fazer isso hoje, e o nosso grupo está entre elas”, destaca Bakuzis.
A conquista de destaque internacional por meio de uma publicação em revista científica de alto impacto reafirma o papel estratégico da pós-graduação na Universidade Federal de Goiás como promotora de ciência de excelência. Pesquisas como essa demonstram a capacidade da instituição de formar profissionais altamente qualificados, capazes de contribuir com soluções inovadoras para desafios globais complexos. O reconhecimento internacional também reforça a importância da formação acadêmica e colaboração interdisciplinar, consolidando a UFG como referência em pesquisa avançada e comprometida com o desenvolvimento científico e social do país e internacionalmente.
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Fonte: PRPG UFG